Jefferson Magno Costa
Há atualmente no mundo um mal aparentemente inexplicável, um fenômeno desconcertante que se tem manifestado agudamente desde o aparecimento das grandes cidades, em meio às superpopulações: a crise do vazio existencial. Nunca as pessoas estiveram tão próximas umas das outras. Nunca dispuseram de tantos meios de aproximação fraterna, de ajuntamento para o trabalho, para os eventos sociais, e para o lazer. Mas também nunca se sentiram tão solitárias e vazias.
Por que essa doença espiritual tem-se apossado de milhões de pessoas, tolhendo-lhes os passos, deprimindo-as, invadindo-as com sentimentos de inutilidade e vazio interior? O apóstolo Paulo, na Segunda Carta aos Coríntios (7.10), fala de dois tipos de tristeza que se apossam do coração do ser humano: a tristeza segundo Deus, e a tristeza segundo o mundo. “Porque a tristeza segundo Deus produz arrependimento para a salvação que a ninguém traz pesar; mas a tristeza do mundo produz a morte”.
A TRISTEZA SEGUNDO O MUNDO
Esse sentimento de vazio que penetra as almas e anula quase todos os grandes motivos (ou incentivos) que impulsionam o ser humano à vida (clinicamente denominado de depressão), é produto do maior e mais antigo desastre existencial que já se abateu sobre a humanidade: o tropeço do primeiro homem no Éden, e a consequente perda de sua comunhão com Deus, seguidos do despertamento de sua consciência com relação ao pecado, e o inevitável e desastroso desvio de seu propósito e modo de vida.
A crise existencial que a sociedade contemporânea enfrenta hoje é o ponto mais alto da escalada multimilenar do ser humano pelos caminhos vazios de Deus. É o somatório de todas as suas tentativas de encontrar a felicidade dentro ou fora de si – experiências que resultaram em fracasso e desilusão, restando-lhe tão-somente esse vazio do tamanho de Deus, segundo a conhecida frase do escritor russo Dostoievski.
Fora do Éden, longe do seu Criador e em linha reta para o desespero, o homem adquiriu para si o perigoso direito de cumprir o seu próprio destino, e caminha na constante busca de uma felicidade que em parte alguma encontrará, a não ser em Deus, pois, como magistralmente confessou Agostinho: “Criaste-nos para Vós, e o nosso coração vive inquieto enquanto não repousa em Vós”.
Mas há pessoas que não pensam como Agostinho. Há pessoas que pensam como “o profeta da liberdade sem Deus”, Jean Paul Sartre, e afirmam que “o homem será aquilo que ele houver determinado ser”. E com isto a humanidade apresenta-se fatalmente dividida em dois grandes grupos: o dos que pensam como Agostinho, e o dos que pensam como Sartre.
O PROGRESSO TECNOLÓGICO COMO ORIGEM DA CRISE DO VAZIO
Não resta dúvida que hoje as pessoas possuem mais motivos materiais para ser felizes do que as pessoas de outros séculos. A quantidade de possibilidades que se abrem diante da atual sociedade de consumo é ilimitada. Não é fácil imaginar um objeto que não esteja no mercado. Porém, mesmo possuindo melhores meios, mais conhecimento e mais recursos tecnológicos do que nunca em toda a sua história, a humanidade se entristece dia após dia.
Longe de Deus, à procura de todas as formas tangíveis de felicidade, a humanidade dá sinais de estar cansada de sua peregrinação interminável e inútil. Os atentados, as falências no sistema financeiro mundial, os terremotos, a fome, o descontrole climático, a violência, a imoralidade, o egoísmo, as greves, o terrorismo, as reinvindicações de toda espécie – eis alguns dos frutos colhidos por quem atacou a natureza e revoltou-se contra Deus.
À proporção que o conhecimento aumenta e multiplicam-se os poderosos recursos tecnológicos que resultam em mais riquezas e comodidades existenciais, recuam, lamentavelmente, para bem longe, as aspirações espirituais que têm levado o homem a se interessar por Deus e a tentar estabelecer um contato com ele. Grande parte da humanidade não tem qualquer interesse em assuntos espirituais. Eis as raízes da tristeza segundo o mundo.
O ser humano dos dias atuais, imensamente rico, herdeiro de todas as conquistas que seus antepassados e seus contemporâneos realizaram, mas que não teve ainda um encontro de salvação com Jesus, que não sabe o que é entregar os seus caminhos ao Senhor, que ainda não aprendeu a confiar nele e caminhar com a convicção de que o mais ele fará (Sl 37.5), é semelhante ao rei da França, Luis XV (1710-1774), que tinha todos os talentos, menos o talento que o tornasse capaz de fazer uso desses talentos.
É o que o grande ensaísta espanhol Miguel de Unamuno chamava de “a busca de uma justificativa existencial, de uma finalidade de vida, de um motivo para estar neste mundo”.
NÁUFRAGOS E SEM DEUS
Desviados do caminho que conduz ao Céu, perdidos no caudal desse bravio e caudaloso rio das paixões humanas, milhões de seres humanos posicionam-se diante da vida com o mesmo sentimento trágico de amargura que sufocou um Albert Camus, encontrando na existência a mesma fatalidade da condição humana a que se referiu André Maurois, e que encheu de pesadelos a vida do genial escritor judeu-theco Franz Kafka, e levou Sartre a divulgar a filosofia do nada existencial e a náusea de viver.
Muitos se sentem, diante do mundo atual, como náufragos que não conseguem chegar à praia ou ao porto desejados. A velocidade do tempo em que as coisas acontecem hoje, a descomunal energia e o ímpeto vertiginoso com que na presente hora tudo é feito, desnorteiam e entristecem o indivíduo perdido nas pequenas e grandes cidades, que sente-se mais um rosto na multidão, uma individualidade dissolvida nesse turbilhão de vidas. José Ortega y Gassett declarou que a angústia do homem de hoje “mede o desnível entre a altura do seu pulso (humanamente lento) e a altura da época atual – célere, insensível, indomável”.
Por isso muitas pessoas, sentindo-se perdidas, vendo que o progresso também dispersou as famílias (porque o companheirismo, o diálogo e a ternura que uniam os seus membros têm sido combatidos por inúmeras influências externas e internas), desiludidas, sofrendo o peso da perplexidade do momento atual, e com medo de após um dia de trabalho, serem obrigadas a voltar a passar a noite em companhia do tédio que as espreita e as persegue por toda parte, saem à procura de algo que preencha o seu vazio interior, e entregam-se à diversões que esgotam o pouco de energia moral que ainda lhes restava. Porém, fora de Deus não há felicidade ou solução para qualquer problema, seja ele de que natureza for.
A FRUSTRADA BUSCA DE FELICIDADE
Sabendo-se habitantes de um mundo que lhes oferece inumeráveis recursos, mas sentido que nenhum desses recursos poderá preencher o vazio que tomou conta de suas almas, muitas pessoas, que ainda não conhecem Jesus como Salvador, como a única solução para todos os problemas da humanidade, desejam ardentemente encontrar uma razão para suas vidas, algo que as liberte das frustrações do mundo, e proporcione paz aos seus corações. Este é o mais antigo anseio do ser humano, e começou no Éden, a partir do momento em que ele perdeu a comunhão com Deus.
Impulsionada por esse sentimento desde tempos imemoriais, a humanidade tem caminhado em busca da felicidade. A antiga civilização egípcia procurou-a no esplendor das dinastias faraônicas, na esperança de vida além-túmulo, e nos monumentos erguidos à morte. Os chineses procuraram-na nas sutilezas da filosofia e em um labirinto de meditações, esperando encontrá-la no Nirvana – que não é um lugar, e sim um estado de espírito, que leva à anulação da vontade e dos desejos, e à extinção da chama vital. Os gregos também procuraram a felicidade nas sutis reflexões filosóficas, na múltipla expressão da arte levada ao seu grau extremo, nas construções de monumentos de mármore, e no culto aos deuses do Olimpo. Os romanos procuram-na na força bélica, na grandeza de suas conquistas militares, e nos prazeres proporcionados pela carne.
E igualmente as demais civilizações têm procurado a felicidade em fontes inumeráveis e diversas, porém não a têm encontrado, pois o amargor, a depressão e o vazio existencial que têm destruído milhões de vidas ao longo dos tempos provam que as grandiosas e inúmeras conquistas tecnológicas e materiais, os sistemas filosóficos e as falsas religiões são incapazes de tornar o ser humano feliz.
Apesar de estudiosos dotados de uma visão enciclopédia dos problemas humanos terem previsto a decadência de tudo, como um Oswald Splenger na sua monumental obra O Declínio do Ocidente, e outros grandes estudiosos em outras visões panorâmicas e contemporâneas da situação em que se encontra a humanidade, nós acreditamos que Aquele que restaurou os caminhos tortuosos e antes intransitáveis que propunham reconduzir o homem a Deus; Aquele que apresentou-se como o único caminho que nos conduz ao Pai; Aquele que mudou a opinião da humanidade a respeito do Criador, da salvação, da eternidade, da vida, da morte, do mundo, do lar, do homem e do sofrimento humano, esse, que não é outro senão Jesus Cristo, pode solucionar a crise do vazio existencial do ser humano, e inundar a alma e o coração da humanidade de felicidade e paz.
A TRISTEZA SEGUNDO DEUS
Porém, desiludido e profundamente infeliz, o ser humano entristece. Sua alma tem sede do seu Criador. Mas essa tristeza é providencial e redundará em salvação, “porque a tristeza segundo Deus produz arrependimento para a salvação que a ninguém traz pesar...” 2 Co 7.10. Porém, é necessário que os que apregoam as boas novas de salvação inundem de esperança esses corações sedentos de paz. Pois esse ardoroso ímpeto de libertação e altura inevitavelmente levará o ser humano que não conhece a Deus a interessar-se pelo sobrenatural, e a desejar a vida eterna. E caso nós não cheguemos antes com a mensagem evangélica de salvação, felicidade e vida eterna com Deus, o diabo se antecipará e apresentará como alimento a essas almas sedentas e famintas, sua lama e seu lixo.
Os que anunciam Jesus, a Água da Vida; os que oferecem às almas famintas o Pão Vivo que desceu do Céu; os que trabalham para purificar e dulcificar os corações pela aceitação do Evangelho de Cristo, somos aqueles a quem o profeta isaías se referiu ao dizer: “Vós com alegria tirareis águas das fontes de salvação (Is 12.3), e como consequência “os resgatados do Senhor voltarão e virão a Sião com cânticos de júbilo; alegria eterna coroará as suas cabeças; gozo e alegria alcançarão, e deles fugirá a tristeza e o gemido”, Is 35.40.
Nós, os que conhecemos a Cristo, temos a imensa responsabilidade de encorajar a todos com a nossa fé, o nosso otimismo e a nossa convicção de que alcançaremos a vida de eterna paz. Um grande pregador disse certa vez que evangelizar não e nada mais do que "um mendigo ensinando a outro mendigo onde encontrar pão." Devemos repetir para todas as pessoas o Sermão da Montanha, e fazer com que ressoe, no mais profundo de suas almas sedentas de paz, o sublime convite de Jesus: “Vinde a mim todos os que estais cansados e sobrecarregados, e eu vos aliviarei. Tomai sobre vós o meu jugo e aprendei de mim, que sou manso e humilde de coração; e achareis descanso para as vossas almas. Porque o meu jugo é suave e o meu fardo é leve”, Mt 11.28.
ONDE ESTÁ A TUA ESPERANÇA DE FELICIDADE?
Devemos falar a todos sobre Aquele que veio nos dar vida, e vida com abundância. Nas regiões celestiais onde ele nos foi preparar lugar, não haverá terremotos, tsunamis, epidemias, atentados, secas ou inundações que destroem o trabalho de gerações, e semeiam a dor e a morte. Não haverá corrupção, nem escravização, nem violência, nem a exaustiva e desgastante luta pela sobrevivência, nem doenças, nem o flagelo das guerras.
Mas enquanto não herdarmos para sempre o Céu, e estivermos aqui na terra, devemos repetir as palavras do salmista: “Então irei ao altar de Deus, de Deus que é a minha grande alegria” (Sl 43.4), e “tu me farás ver os caminhos da vida; na tua presença há plenitude de alegria, na tua destra delícias perpetuamente”, Sl 16.11.
Desde há muito tempo está aberto o caminho para o Céu. Ser feliz depende da justa conscientização de que a verdadeira felicidade foi conquistada a preço de sofrimento e sangue, e só há um que a pode nos dar: Jesus Cristo. Toda e qualquer tentativa ou busca de felicidade fora de Jesus resultará em fracasso.
Os que jazem no vazio existencial devem considerar que, além da grande bênção da salvação e da maravilhosa experiência com Cristo, a vida oferece outros motivos de felicidade – desde que essa felicidade não se apoie nos enganosos subterrâneos dos vícios, dos prazeres carnais, ou em muitos outros pecados que o mundo oferece. Devemos agradecer a Deus simplesmente por estarmos vivos e podermos encher plenamente os nossos pulmões de ar, sob o sol que ilumina a todos a cada manhã. Um grande poeta (Fernando Pessoa) escreveu certa vez:
Outras vezes ouço passar o vento,
e acho que só para ouvir passar o vento
vale a pena ter nascido.
OLHANDO A VIDA PELOS OLHOS DE CRISTO
Cristo nos ensinou a não gemer ou desanimar sob o pesa das dificuldades e dos sofrimentos – mas pela fé e impulsionados por sua graça, enfrentá-los e vencê-los. Alguém pode argumentar que todos nós haveremos de morrer um dia. Sim. Com exceção dos que não provarão a morte por estarem vivos no grande Dia do Arrebatamento da Igreja, todos nós morreremos. “Mas para mim o viver é Cristo e o morrer é ganho” Fp 1.21. Após a nossa morte, o sol continuará a nascer todos os dias, em todo o seu esplendor. A vida prosseguirá, a renovar-se sempre, até que as dispensações de Deus para este mundo se completem. As crianças que brincam pelas manhãs e às tardes, a correrem, a empurrarem-se, a chamarem-se, ofegantes e incansáveis, radiantes de alegria, hão de crescer e amar, e conduzir a vida para um ponto mais adiante, conforme nós já o fizemos, até que seus filhos e netos as substituam nessa maravilhosa e sempre renovada dádiva de Deus aos homens – a vida. Devemos agradecer a Deus por ela. Estamos caminhado para a morte. Porém, a morte não será nada mais do que a infância da nossa eternidade com Cristo, o dia em que se inaugurará para nós nossa vida de plenitude ao lado do nosso Deus!
A pessoa que nunca está contente com o que é, nem com o lugar onde está, não aprendeu ainda a olhar os lírios do campo, e a concluir com Jesus que, sob os cuidados que a providência divina faz descer do Céu sobre eles, “nem Salomão, em toda a sua glória, se vestiu como qualquer um deles”, Mt 6.29.
Muitas vezes nem é necessário alongarmos o nosso olhar para muito longe, a fim de reconhecermos os presentes que o Senhor nos dá todos os dias, quando abre diante de nós, de inúmeras maneiras, suas mãos generosas e cheias de tudo o que necessitamos. Mas o justo se alegrará, acima de tudo, na salvação que já recebeu do Senhor. “Portanto, não vos entristeçais, porque a alegria do Senhor é a vossa força”, Ne 8.10.
Jefferson Magno Costa- Blog Sublime Leitura
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